Reencontro dos amigos Sebastião Jorge e Isaac Dias |
Este foi um ano de poucas postagens neste blog,
quando as atenções ficaram voltadas mais para outras atividades, especialmente
na dedicação à Rádio Comunitária São Bento FM, onde buscava meios para
reestruturá-la e dota-la de melhores condições para oferecer qualidade aos
nossos ouvintes e admiradores. Mesmo assim, não poderia abdicar do exercício da
profissão que abracei e amo, por isso alguns registros importantes foram
destacados nesta página. Mas muito me honra, concluir este ano de 2014 com uma
postagem especial, não de minha autoria e sim de um grande sábio e mestre que
nos faz viajar em brandas nuvens nas leituras dos seus artigos e crônicas.
Trata-se do professor, advogado e jornalista Sebastião Jorge, cuja crônica
publicada no Jornal O Imparcial tive a liberdade de reproduzir abaixo.
30 anos depois
Sebastião Jorge
Jornalista
Há trinta anos que não visitava a terra
onde nasci, em São Bento, na baixada maranhense. Voltei em setembro último a
convite do amigo Isaac Dias. 0 festival de alegria
provocou marcantes lembranças que explodiram no silêncio de uma festa
interior e de interior.
O que era para ser só satisfação se
misturou a certa melancolia. Considerei-me ter alguma semelhança com “Funes, o
memorioso”, figura emblemática de um conto do genial argentino Borges, o qual
não consegue esquecer o que viu, nos mínimos detalhes, como as folhas de uma
árvore, na perfeição e deformações. Funes confessa a incapacidade de carregar
no ombro a quantidade correspondente ao peso das recordações, isto, se peso
houvesse. Elas pesavam tanto quanto o que gravou na memória. Incomparável Jorge
Luis Borges!
Ao chegar ao meu destino fiz uma
observação... A cidade não era a mesma da minha infância e juventude. Ao pisar
o seu chão senti a realidade da vida, rica de acertos, enganos e desenganos.
Mistura de inocência da infância e os passos da malícia da juventude que me
levaram a enfrentar a maturidade.
Estava curioso para olhar os lugares
por aonde andei, de calça curta e comprida. Queria rever as pessoas amigas, o
campo de futebol “Tupi”, no qual concluí que jamais seria um regular jogador.
E, isto, ainda que fosse, digamos de bola de praia ou pelada de rua. Talvez, no
máximo, mais um do quadro “bola murcha”, que a TV Globo apresenta aos domingos
no fantástico, ao revelar nulidades. Seleciona os gols perdidos, com área sem
goleiro, aliás, a trave por testemunha e defensora. Fui esforçado. Corria muito
e pegava pouco na bola.
Quando o meu time perdia os colegas
olhavam para mim como a pedir substituição. Qual nada. Era o senhor poderoso
dono da bola. E o dono da bola não se mexe.
Havia muito a rever naquele paraíso
perdido. Pouco tempo para matar saudades, 24 h, e curioso pelas coisas do
passado. Senti- me perdido. Ao saltar do ônibus, depois de viajar de ferry boat
e apreciar uma paisagem que a natureza dotou de preciosidade incomum, na graça
do voo dos guarás brancos e vermelhos, cujas acrobacias não passavam de um
bailado repleto de graça. Coloriam um espaço comum e familiar em outros tempos.
Em terra senti-me perdido.
Não sabia em qual o local da cidade me
encontrava. Quando estudante e de férias a chegada e saída, depois de uma longa
viagem de barco, começava e terminava pelo porto. Vavá meu companheiro nessa
jornada, alertou-me: “Desperta Sebastião”. Não havia rodoviária. A viagem,
quando de barco, maltratava, pelo balançar do barco, conforme o vento. Todos tinham
pavor das violentas e traiçoeiras ondas do boqueirão. Parece manso, hoje,
certamente pela ingerência do homem a serviço do Porto do Itaqui e Vale. A
alegria da chegada e o vigor da juventude venciam o medo. Senti-me um
forasteiro na minha terra.
Queria dirigir-me à casa onde nasci e
cresci. Desejava como num filme reviver o passado. Olhar a goiabeira amiga que
me servia de trampolim. Os galhos amparados no muro ajudavam-me a alcançar a
rua, onde me esperavam colegas às brincadeiras da idade. Espaço enorme onde
morava. Tinha dois poços e fruteiras. Um salão onde dava festas de vitrola e
conjuntos musicais nas férias. Cadê a casa? Decepção. Derrubaram-na e
construíram um conjunto para diversos fins.
Restaram as lembranças de dias felizes.
Não há como materializar o passado. Tudo se acaba. Vi e vivi tempos da
pré-Revolução Industrial, com fogão à lenha, água de bilha, filtro e demais
utensílios que o progresso substituiu. Mas, a saudade ficou. E dói. Voltarei
breve e sem convite.
28.Dez.2014
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